sábado, 24 de janeiro de 2015

em pé.

Despenca um coração
como se o ano fosse um penhasco,
passando por diversas mãos e pedindo segurança.
No frenesi da solidão e a sua dança
normalmente acompanhada, sempre sozinha.
Corpos inteiros, apertados pela superficialidade
Apartamentos escuros, as visitas preferem a sala, a cozinha
já que o quarto vomita verdades.

Não entre. Entre, por favor, venha
a cama engole e, como uma tela de cinema, mostra segredos
o passado ressuscita no momento do orgasmo
e o grito de prazer vira dor, tristeza do dia que amanhece
um nome ecoa na memória, o que o tempo não perdoa
a cabeça não esquece.

Se depois da coragem o que vem é libertação,
o que segue a fuga é a vergonha.

A percepção alterada aponta uma pele, braços quentes
Embolado, o coração dilacerado, se enrosca pra vencer o frio
Como um pássaro recém nascido, quer um abrigo
um amigo...
pulsa de novo, batidas arrítmicas, trêmulas
o sangue volta a percorrer seu trajeto normalmente,
mas o fim é escroto.
Daquele abraço carinhoso, vem o impacto seguido pelo sufoco:
o amigo é um monstro.

Corre, Foge de novo o coração ingênuo.
1,2,3, pára por um tempo, o peito dormento
o vento sussurra:
melhor cavar, que as tuas próprias veias e vasos virem tua raiz.
De repente, aparecem mãos reais, mas a fantasia
todas e tantas mentiras, o fazem, valente, ter medo
e com a pá da agonia
ele se enterra, é mesmo sepultado
todos acreditam que o coração foi amaldiçoado
e está morto.
Rosas, lírios, um girassol, até um beija-flor o visita.

O nada e o tudo.
Será que nadou tanto e morreu afogado?

Enche, míngua, cresce, vira nova a lua
E na terra esquecida, cemitério dos desiludidos,
brota, forte e sozinha, uma árvore linda.
ele não é mais ele. Agora é ela, uma mulher
e como todas, nascidas na opressão viraram resistência,
parece que foi morta, mas está viva
e em pé.



terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Não há poesia numa vida vazia
nem música que descreva o silêncio

corações estraçalhados perderam a rima
que escorreu pelo caminho
tudo acaba nas águas dos rios, ou no salgado do mar
Ingrid, Afonsina, Virginia...

mulheres, como eu, ousaram
e todas morreram sozinhas.

não há companhia na sociedade doentia
os amigos sumiram numa neblina
logo atrás das árvores, eu os vejo
são vultos que já não escutam.

a morte não precisa ser física
a fumaça não precisa ser pólvora
a bala poderia ser a amiga que eu queria
aquela que se alojaria na minha cabeça
talvez a única que não fugiria.

Não há tesão em corpos sujos de histórias
peles machadas de memórias
e nem mais palavras para bocas amaldiçoadas
que gritaram tantas blasfêmias e espalharam tanta dor

ecoam os meus insultos, ninguém está perto.

Bate o vento na sacada, árvores dançam esquisito
uma mulher olha para o nada e vê o infinito

não há nenhum abrigo em tempo de guerra
caminham, sem pernas, os sobreviventes
e descansam nos túmulos os mortos.
Nos muros, algum solitário escracha a ironia
perder é ter paz, vencer é agonia

o troféu da guerrilha, ela segura em suas mãos
tem forma espiral, a tristeza o construiu, ninguém o vê
sorri, como louca, era melhor segurar uma granada
e ser aquela que explodia, por quem se lutava.

Não há luta sem paixão.
Não há paixão depois da juventude.

Em um quarto sem lembranças
alguém encosta a cabeça, fecha os olhos e tenta sonhar ainda

a saudade é íntima
tem a ver com aquele rosto que aparecia no espelho uns anos atrás
e com aquelas palavras todas na poesia, que enfeitavam os dias.
E que se perderam na estrada e nunca mais serão ditas.

Juramentos nunca cumpridos,
mas alguém os cumprirá sem nem tê-los prometido.

Sempre há um novo colibri
e todas viramos violetas velhas.