quinta-feira, 30 de maio de 2013

now we are free

Olho um retrato, um que sobrou por aqui.
Não sinto nada

Pergunto, olhando teus olhos, porque fizeste isso comigo?
porque pregaste meu coração assim
porque tanta maldade...
porque tanta loucura...
porque tanta covardia...
porque tanto moralismo...
porque tanto preconceito...
porque tanta desigualdade...
porque tanto egoísmo...
porque tanto medo...

morreste aqui dentro porque mataste
e quem mata, também morre, nena.



noite

Caminho pela calçada, passo em frente ao portão que tantas vezes entrei. Ninguém mora mais ali. Sigo, gotas finas caem, as estrelas sumiram do céu. Alguém se aproxima, pede companhia e não o que tenho. Alguém quer conversar, ele é tratado como bicho, mas não morde. Quer, de mim, humanidade. Seguindo, mais a frente, vejo jovens, vejo a alienação. Não sabem ou ignoram as dores do mundo, bem vestidos, bebem e dirigem seus carros. Coitados, acham que são felizes, com suas roupas caras, seus sapatos costurados por mãos infantis. Chego em casa, abro a porta, passam 5 viaturas policiais, todos sérios, cumprindo um dever doentio de proteger o patrimônio para terem o que comer. Sento-me e escrevo, o telefone toca. Pessoas me ligam, a justiça não existe e come os sonhos dos que ainda são capazes de sonhar. Vou para lá, 70 olhos brilhantes. recupero-me, injetam em minhas veias uma dose alta de esperança. Sento na roda, todos iguais, alienígenas como eu, todos com o sangue azul. Cantam, ainda, cantam a mudança. Olho para o céu, entre as árvores - que não existem mais- a lua. Registro a cena, memória fotográfica, se meus olhos fossem uma câmera, seria uma das fotografias mais lindas que alguém já viu. Dois homens de verdade tocam violão e cantam o mundo tão desigual...Eu poderia conter as lágrimas, mas ainda estou viva. Elas caem sem pedir minha licença, todavia não molham de tristeza o ambiente. É bom estar aqui, eu penso. Entregam-me um papel, um papel judicial que manda todos saírem daquele lugar, um mandado que ordena à todos que não sonhem. Vejo o prazo, ainda temos tempo, eu digo e ouço que vamos resistir. O vinho barato passa de mão em mão, pobres, ricos, indigentes, todos tem bocas iguais e bebem e compatilham tudo. Sinto uma mão alisando meu ombro, olho ao lado e vejo uma mulher, uma mulher de verdade. Vejo, também, um sorriso mais doce que cachaça com mel, que caipira açucarada em excesso. Ela me agradece. Pelo quê, eu me questiono. Ela diz que precisa descançar, não dorme bem há dias, tem os olhos cansados, mas repletos de força. Ela é linda, lindíssima e quando apertamos as mãos, eu me senti viva. A noite segue, não se arrasta, segue calma, o vento balança as barracas, as árvores que não existem mais. Agora o morador de rua dos olhos cor de mel, quase verdes, senta ao meu lado. Diz-me que vai me proteger. Eu quis dizê-lo que não era preciso, mas mesmo com o corpo massacrado de rejeição, de violência, ele sentia necessidade de abraçar e de dar proteção. Ele, escória da sociedade, da sociedade normal, ainda sabe o que é amor. Explicou-me porque os olhos dos negros são tão escuros e o dele não era. Falou-me que era preciso olhar diretamente ao sol para ter olhos grandes e que as geleiras e o frio pintavam de azul os olhos dos gringos. Deite-me na raiz de uma das árvores, que não existem mais, ouvi histórias, não falei muito como sempre faço. Um homem com cara de mau perguntou se poderia ficar ali comigo, eu deixei. Sorri com a alma quando percebi que se tratava de valentia e não maldade aquela cara amarrada e séria. Ele perguntou se eu gostava de chocolate, respondi que não muito, então ele levantou-se e retornou com um para mim, disse que adoçava o coração. O vento gritou que eu deveria ir embora, levantei-me e não existia como sair daquele lugar, não passavam carros na avenida, muito menos algum táxi. Fiquei parada e disse que tinha sorte, olhei para a esquerda e vi um ônibus. Pararam para mim com boa vontade, levaram-me até a rua da minha casa. Chego em casa e coloco-me a escrever. Em segundos, a notícia, todos do acampamento estavam presos e as árvores que tinham banhado meu corpo, minhas mãos de paz não existiam mais. Meus novos amigos que vieram do mesmo mundo que eu, estavam algemados e machucados em alguma delegacia do planeta terra que é habitado por seres humanos desumanizados.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

cristalino (parte 2)

e o pierrot, errou
coitado
viu uma flor
num arbusto velho e encolhido
meio morto, meio vivo
um horror!

o pierrot errou
mandou vida, fez poesia
deu um presente
fez palhaçadas, queria a alegria
alimentou uma serpente.

deu o coração
recebeu a humilhação
pobre pierrot

morreu na sarjeta, embriagado
com o rosto pintado de sonhos
e as mãos sujas de humanidade

Pierrot virou Arlequim


cristalino


Tu que colecionas o amor que recebes
sem intenção de amar,
que alimenta a esperança 

doce, como é doce e atenciosa

(covarde)

não sabe a maldade que comete

coloca um cego no deserto
só por ego, vaidade.

Depois, o eco chuta a tua porta

E todas as lágrimas que causastes
subirão, contrariando a gravidade,
para caírem, então, dos teus olhos 

tu estarás sem a visão

(que aflição)

é que na vida, meu amor
todo mundo encena,
cedo ou tarde, 
o pepel do Pierrot.



quinta-feira, 16 de maio de 2013

foi

me posto a escrever
por mim, só por mim
a dor deixa dormenta minha mãos
e eu repito, a cada segundo, que nunca mais
nunca mais...

quem dá isso hoje em dia?
a cachaça tá vazia
esse é último dia

maio venceu agosto
mais um inverno pra torturar meu corpo
não tenho nenhum escape, nenhuma vontade

se eu levantar amanhã, é porque meus ossos cansaram da cama

eu escrevi uma carta, um crime no século que vivo

nada é de graça aqui
mas eu não coloquei preço
mesmo assim, foi negado

eu não falo a lingua dos homens
tampouco a dos anjos

foi com o vento e veio com o frio
essa tristeza que ultrapassa o amor
alcança o existencial

que me adianta estar aqui?

está acabando a carteira do cigarro
e o tempo de sofrer por ti.

AMANHA VAI SER OUTRO DIA...

segunda-feira, 13 de maio de 2013

sun

é complicado estranhar o bem estar, a tranquilidade. ela voltou pra mim, finalmente. as tempestades de agora são formadas no céu e atingem a todos. já não sinto medo da solidão, do não de ninguém. estou livre, incrivelmente livre. quem encosta, sente. meus passos voltaram pros meus pés, minhas mãos até dançam por aí, sem desejar ninguém. eu posso até trocar olhares, mas nunca mais dou meus olhos pra alguém. são meus. são eles que me mostram hoje a ironia da vida. perdi tanto e, na verdade, não perdi nada. quem foi embora na hora do incêndio, não merece ficar para ver a primavera comigo. a roda viva do coração é foda: gira que nem roleta e eu não tive sorte. foi preciso tempo pra levantar da mesa e não apostar mais. estou sentada na beira do rio que sempre esteve ali e eu, presa, nunca vi. ele é lindo, o sol é lindo. eu estou aonde quero estar.


I feel that ice is slowly melting


Here comes the sun
Here comes the sun
And I say
It's all right!!

quarta-feira, 8 de maio de 2013

centésimo poema de amor (sem amor)


relutei para sentar-me nessa cadeira

e escrever o poema cem.

sem ela?
nunca com ela?
ainda sem ela?
sempre sem ela?

não, não são cem poemas de amor
e uma canção deseperada:
são cem escritos desesperados e
uma canção de esperança!

esse aqui, não é mais especial
junta letrinhas que dizem sempre a mesma balela
percorrem ondas magnéticas
são versos aflitos que bucavam um sorriso,
mas só arrombam a porta dela

na medida que o tempo passa,
a madeira vira aço?
a retina fica  esbranquiçada
e nada mais vê?

catarata é ela pros meus olhos!

nada do que escrevo, falo,
a penetra
não, 
meu sexo não permite invasão;
ele recebe.
minha poesia recebe dela,
um banho de água fria
nem um suspiro, nem um ...um..."que lindo"
não serve nem como papinha pra vaidade!
são poemas invasivos, a invadem toda
 e nadam dentro dela até o ar acabar
depois?
morrem afogados, assassinados pela razão!

meu centésimo desabafo,
que bafo!

será que Matilde sorriu?
a Mafalda nem leu.

amanhã escrevo a tal canção de esperança
hoje nada em mim, nem uma titiquinha, acredita
(mentira)

ou, talvez, escreva mais cem bobagens
ora, me atrever a rabiscar sobre saudade!

cem poemas de amor sem amor

formei-me, sou poeta, aquele tal fingidor
diplomado na arte de quê?

que louco...

sabem,
mais louco ainda é que
cem poemas de amor, pra ela,
foram pouco, muito pouco!
tão pouco, que se fossem escritos a punho
virariam folha amassada
jogada na lixeira orgânica
misturada com as frutas estragadas
junto com aquela maçã esquecida
que apodreceu na geladeira
porque nenhuma boca a mastigou.

é, são cem poemas de amor!
sigo sã? algum dia fui?

bato na mesa:
-maldito professor Chico!!
eu, aluna relapsa, estava presente
naquele infâme dia quente
em que ensinastes toda aquela pobre gente
a enchergar na escuridão.




domingo, 5 de maio de 2013

delirante

esse sereno da madrugada
minha voz rouca
meus traços deformados da febre

minha boca costurada
essa imagem no espelho que desconheço

um eco alto ensurdecendo
uma alma oca
vazio, casa sem móveis
delírio do alcool
medo da solidão
ele me diria que eu cavei meu próprio buraco
essa dor sórdida e fiel que não abandona

minha lingua dormente, sentindo mil gostos
sem sentir absolutamente nenhum

meus dedos tarados
esse desejo em rasgar tuas roupas
te ver de olhos bem fechados
esse sussurro que nunca veio

essa espera

seja o que for, essa esperança maldita
de que o dia amanheça diferente

esse sonho desconecto
jogado num canto, esquecido por todos

eu abro meus olhos
de imediato, me remetem teu rosto

essa poesia que não toca
que destrata, que agride

essa perturbação medonha

uma conta zerada, um ano que não passou

minha planta morta
essa desatenção

o gato no telhado mia a vida
(eu fecho a porta)
a morte fala meu idioma

sangro

uma hemorragia que não finda
pelo chão, escorrem pedaços

essa parede invertida, de cabeça pra baixo
duas mãos,
essas unhas roidas

essa minha ruina

ouço vozes, mandam-me ter calma
- mas como - eu grito - eu tenho alma!?

esse suspiro que não puxa ar

um limite invisível
até onde se vai?

eu arremesso pro céu com toda a minha força
tranco os pés no inferno pra não ir

esse cotrato oneroso

essa lei intocável, clausula pétrea
rasgo, invoco o poder constituinte
a onda gigante arrebenta a pedra, mas não fura

pra onde vão os pássaros esse ano?
sempre pro mesmo lugar

mês que vem eu pago as contas
renasco, firme e forte

agora, enfio o cano na boca,
e como uma bala

não estava, não estou e não posso ir

onde estão as cores desse filme cinza?

critico e convenço

não mais!

nem eu me elejo
voto em branco

assino teu despejo, reconheço firma

essa cama tão desarrumada
é o reflexo do meu coração