Perdoa essa explosão atômica que nasce da dor de viver sem
ti. Perdoa as palavras ásperas, os insultos. É o mesmo que as poesias lindas te
dizem, só que é escuro, mas dizem o de sempre. Dizem que te amo! Dizem que te
espero em qualquer lugar, num dia de chuva ou de sol, numa noite ou madrugada.
Em qualquer lugar que eu esteja, vou cuidar os lados e imaginar tua chegada. Meu
bem, eu posso errar de tantas formas. É tudo do desespero assustador por não poder
perder minhas mãos entre teus cabelos, puxando- os até o meu rosto para sentir
o cheiro, teu cheiro que eu sinto em todos os lugares, sem nunca ter sentido.
Eu protestaria todos os dias se essa revindicação colocasse meu corpo embaixo
do teu. Eu lutaria, levantaria junto com
o sol, combateria todas as teorias da moralidade que me proíbem de estar ao teu
lado, se tu desejasses o meus beijos. Tenho medo da força esmagadora dos meus
punhos, do meu corpo, se tu me quisesses. Mas, cariño, não me queres. Isso dói
como uma navalha na pele no inverno da Sibéria, dói como a fome dos miseráveis
da África, dilacera como o peito das mães argentinas que ainda esperam o
retorno dos seus filhos que nunca voltarão para casa. Dói como a menina do
Banksy que deixa escapar seu balão e cresce sem vontade com a imposição da
vida. Eu me solidarizo com todos que sofrem, queria abraçá-los, queria ter os braços dos gigantes que moram nas nuvens para
acomodá-los no meu peito. Teu não dói como a dor de um sabiá mudo e de uma andorinha
atingida pelo estilingue. Há um silêncio insuportável dentro de mim. É feito de
um barulho imenso que mescla os gritos dos negros e dos índios diante da
desumanidade do homem branco. Meu coração acelera e para, retoma as batidas e
segue apenas. Eu te queria tanto! Eu, que não acredito em espíritos, me vejo
desencarnada na fogueira de alguma praça inglesa, sinto meu corpo queimar, mas
não sinto vontade de resistir. Nessa noite, sinto toda a dor dos que nasceram
no tempo errado, no corpo errado e vagueiam pelo mundo, enjaulados. O gênio da lâmpada mágica está sentado ao meu
lado agora, tão triste como eu. Ele pensa que sempre deu a todos os seus
maiores desejos, o pó milagreiro acabou e ele não foi feliz. Está comovido comigo, mas não pode me ajudar.
O pedi o tapete voador emprestado para ir até tua janela e te olhar dormindo.
Deus, diabo...nunca te verei dormindo, meu amor! Nunca te verei secando os
cabelos, calçando os sapatos, nunca abrirei teu sutiã...A minha dor é pior que
a dor da morte: aquele que perde quem ama, o tem na memória, é repleto de
lembranças e por mais que saudade
corroa, ela também pode fazê-lo sorrir.
Se eu pudesse silenciar, toda a história seria distinta. Os
meus olhos deixavam claro, não abriam espaço para a mentira. Se soubesse que os
olhos, sozinhos, diriam tudo, teria escrito cartas de amor, mas as guardado
para o momento certo. Se eu pudesse acreditar no momento certo, não teria
enviado músicas, poemas, atenção. Sabotei o tempo e o tempo cobrou o preço:
mandou-me palavras vazias, um não que não libertou, excluiu-me a possibilidade
de ouvir e ver, sentenciou-me a tantas interpretações e a sentir- apenas- sem
aliança com a razão.
Todas as teorias que eu tinha sobre, eram vagas e loucas.
Nada poderia ser comprovado, nenhum sinal poderia ser levado a sério. Só eu
sabia e nem eu acreditava. Quando nossos olhos cruzavam-se, os segundos viravam
anos, todas as vozes sumiam, todos os corpos desapareciam. Ela dizia com seus
olhos, que eram de uma cor única, dizia coisas em outra língua. Eu dizia o que
ela já sabia. Eu não entendia, ela não entendia. Melhor fugir, melhor não encostar, eu supunha,
então- às vezes- ela passava de cabeça baixa ou interrompia aquela conversa sem
palavras que era integra; todos podem falar ou escrever o que bem entender, o
papel e os ouvidos suportam tudo, mas ninguém consegue dissimular com os olhos.
Mentir, talvez, diante de um bom preparo, é possível. Mas omitir, disfarçar,
mascarar, ninguém consegue. Os olhos dela me chamavam para perto. Era como se
eu soubesse totalmente a solução de um crime hediondo e não conseguisse, não
tivesse provas cabais e o assassino permanecesse impune. Eu tinha algo que foge
a razão humana, algo abstrato, intocável que só poderia ser compreendido se
houvesse empenho e interesse. Era preciso ajuda, um amigo. Nomeei o mais
sincero de todos, o mais fiel de todos, o mais presente de todos,
esquecendo-me, também, que era o mais desatento de todos. Inúmeras vezes, como
uma árvore seca, permaneci na estrada do prédio uma hora antes dela chegar,
necessitando- em certos dias- mais uma hora depois do suposto horário que ela
chegaria para depois saber que ela já estava dentro do prédio. Ficava lá, eu e
meu amigo com um cigarro na mão. Não desviava o olhar do caminho por onde ela
surgiria. Meu amigo, era amigo como poucos, prestava-se à essas situações, mas
no momento que eu provaria- seriam duas testemunhas- ele esquecia-se do que
esperávamos. Eu tinha vontade de matá-lo. Acreditava nele acima de tudo. Se ele
me dissesse que não percebeu, eu teria desistido e não estaria aqui, agora, às
05:46 da manhã sendo consumido pela insônia e tristeza da dúvida. Era tudo
coisa da minha cabeça, fuga desesperada do meu ego furioso por não ter sido
amado. Será? Convencia-me por dias disso até que chegava o dia em que ela
aparecia: lá estava, novamente, de mãos atadas com o sobrenatural. Eu a via
duas vezes por semana, todas as semanas, todos os meses. Utilizei todas as
táticas possíveis e até impossíveis como, por exemplo, fugir entre os
corredores do prédio, utilizar as escadas, fazer caminhos maiores para chegar
onde deveria e não vê-la, mas o poder da fé, tão subjetivo e inexplicável, a
força do meu pensamento de amante, fazia-me encontrá-la sempre. Eram três
elevadores no prédio, matematicamente falando, eu tinha 33% de chance das
portas abrirem para que eu entrasse ou saísse e a visse. Isso desconsiderando a
questão do tempo, da necessidade do momento exato e dos passos contados que
deveriam andar sincronizados para que nos víssemos. Eu não acreditava em
destino e nem em nada que não tivesse o auxílio, pelo menos, da ciência do
homem. Mas eu também não acreditava que era possível, perante sete bilhões de
pessoas, desejar apenas uma. Ela veio, de fato, pra fazer-me repensar minhas
teorias, veio para nomear minhas teorias, veio para resumir-me à um incapaz que
viveria inutilmente, sem brilhantismo, se ela não sorrisse e fizesse o sol mudar
de ideia e surgir durante a noite. Era preciso sabedoria para lidar com aquilo.
Era preciso tranquilidade para não ceder ao desequilíbrio da dúvida e parar na
cama de um hospital com crise de ansiedade aguda. Todas as evidências deveriam
convencer-me que eu nem existia na vida daquela mulher; que ela não perdeu um
segundo, sequer, do seu tempo tão precioso pensando em mim; que ela não se questionou por nem um momento
de como seríamos se ela permitisse a conjugação do verbo viver no pronome
nós; que em nenhuma noite ela perdeu o
sono, lembrando das minhas palavras e dos meus olhos tão ingênuos; que, em
sonhos, ela não suou ao imaginar minha boca deslizando por toda a sua pele
branca; que ela nunca nem cogitou saber quem eu era, onde vivia e como vivia e
nunca estacionou o carro diante do meu edifício só para ver-me; que ela não
desesperou-se numa mesa de bar ou no seu sofá na presença da sua melhor amiga,
contando-a que, aquela situação, a deixava confusa.
Tudo que eu queria era esquecer, ir adiante e não me prender
numa história sem lucidez. Então, os olhos dela gritavam-me algo que eu não
entendia. Era como se eu entendesse a língua espanhola, mas não tivesse domínio
suficiente. Eu captava a essência das palavras, mas quando
devia formar as frases, perdia-me e ficava tudo desconexo. Os olhos dela
diziam-me sim, amor, agora, vem, não vai, medo, confusão, dor, espanto, paixão,
admiração, respeito, mas eu tinha guardado nos meus pertences, respostas dela
que diziam: sem amor,não agora, não vem, vai, não tenho medo, não sou confusa,
minha dor vem de outro, tua ação não me espanta, não tem paixão, mas te admiro,
há muito respeito e nada mais. Eu precisava de dez minutos, não mais, diante
dela e de mais ninguém para ter certeza. Se eu a incomodava com as minhas
investidas de amor, mas deixava claro que se ela sentasse na minha frente e
convencesse-me, como boa argumentadora que era, eu partiria para nunca mais voltar,
porque havia tanta negação dela em chegar perto de mim? Tudo bem, eu aceito a
tese do descaso, da insignificância de alguém na vida de outrem, da falta de
tempo pra assuntos que não são tão relevantes. Aceito tudo, respeito todos que
me julgam louco por persistir de mãos dadas com a empatia. Eu a tinha como a
mulher mais, a mais mulher de todas, a grande mulher. E eu a tinha assim, por
todas as ações e palavras que ela tinha na vida. Era torturante pensar que ela
desprovia de imensa solidariedade para todas as causas do mundo, menos com o
meu coração. Era uma dor absurda imaginar que eu seria o único segregado na
construção do seu universo tão justo. Nunca a vi cometendo grosserias, nunca a
vi agindo sem educação e respeito, mas, por algum motivo- comigo- ela não era
capaz de ser humana. Uma vez fiquei à um palmo de distância da sua boca,
eu tive que baixar os olhos e esconder minhas mãos nos bolso porque o olhar
dela comeu todas as minhas forças e desmanchou toda a minha capacidade de
expressão. Gaguejei tanto, tremi tanto que, ao lembrar, envergonho-me. Eu
deveria tê-la encarado, eu sei, mas o cheiro do hálito dela, o perfume do
pescoço dela e, sempre, os olhos dela, inibiram toda a minha coragem que sempre
foi minha principal característica.
Hoje eu sei e já compreendo melhor muitas coisas. Respeito
muito mais o misticismo, a fé, as crenças. Ainda acredito na ciência, mas não a
tenho mais como verdade absoluta. Tudo isso, modificou-se só com a força de um par de olhos – os olhos mais
lindos que já vi- que foram capazes de igualar-se a razão e fazer-me ajoelhar e
confessar minha insignificância humana diante do que não há explicação, diante
do segredo dos olhos dela.
Eu quero me afogar na merda. Ser esquecida e me esquecer de
mim, dos meus pensamentos otimistas que masturbam minha mente e me fazem
acariciar essa esperança maldita de que um dia virás. Eu quero uma bebida amarga
ou doce, tanto faz. Um corpo branco ou negro ou pardo ou...um corpo pra me
esquentar. Uma boca macia tocando os meus seios. Eu quero seios nas minhas
mãos, desejar seios, muitos seios e os teus, não! Eu quero me deitar na grama
molhada do sereno, não sentir frio, não sentir medo. Ver a lua aparecer no
canto do céu, me ignorar e depois sumir novamente. Ver o sol levantar pra
depois dormir. Eu quero um barulho infinito que não me deixe ouvir meu nome,
teu nome. Eu quero um homem, alguém, algo que me faça te esquecer
infinitamente, eternamente. Eu quero dobrar a esquina, virar a página, rasgar a
página, cuspir na página, por no lixo a página que tem como marca d´água teus
olhos, tua boca, tua perfeição atormentadora, tuas palavras precisas que falam
sempre o que quero ouvir sobre o mundo e nunca o que preciso ouvir de ti. Eu
quero matar, morrer pra ver se, assim, tua estrutura de aço, de ferro
balançaria. Eu quero me ajoelhar e implorar, crer no deus imaginário, fazer
promessas e ter a chance de cumpri-las. Eu quero o direito, o justo, não quero
a bondade, não quero a gratidão, não quero a caridade. Eu quero a solidão
extrema da companhia fajuta, a distração. Quero qualquer coisa que segure o
peso dos meus dias, a dor ínfima da tua ausência na minha vida. Quero chorar,
se for pra chorar. Uma lágrima salgada, igual a todas as lágrimas que caem de
todos os olhos que choram. Eu não quero essa gota vermelha, que corta meu rosto
e é solitária. Não aguento mais, nega! Não suporto mais! Não quero mais, não,
não, não...eu poderia ter me solidarizado com os loucos que morrem de amor, que
matam por amor, que amam de verdade, mas não queria ser um deles. É tanta submissão!
Submissão ao tempo, à imposição desse sentimento. Eu quero cerrar as grades do
meu peito, ver um sorriso e sorrir, segurar numa mão qualquer e partir. Eu quero
um trem de trilhos incertos, mas que viaje pra longe, bem longe de ti. Eu quero
ter a coragem de entrar nesse trem. Te liberto hoje, cavalo selvagem, cavalo xucro
que negou minha maçã colhida do pomar de um homem humanista e solitário que
toca violão e canta pras plantas e os animais e não teme a solidão das grandes
metrópoles. Vai, corre pelos campos, sente o cheiro das flores, morde o vento na cara. Eu tiro de ti o
peso do arreio, do pelego, do meu sofrimento por não ter te convencido a ficar
comigo. Vai! Alguém com mais paciência, alguém com mais maturidade te oferecerá
açúcar cristalizado e eu torço que aceites. Eu abro os portões, arrebento as
cercas, jogo longe as esporas, jogo longe os lençóis que camuflam meu ego,
minha vaidade ferida. Quero que teus cabelos negros e compridos voem mais que
uma andorinha e teus olhos expressem a felicidade que senti quando vi uma laranjeira
linda, me aproximei e me ergui para alcançar a fruta que sempre desejei. Foi em vão! Foi em vão? A vida me colocou freios e ferraduras, hoje
sou cavalo de passeio, de carruagem de contos de fadas. Levo pessoas para suas
estradas, montam em mim e eu aceito. Dizem que eu mudo vidas. Dizem que eu
ajudo, que arranco segredos escuros, olhares de dúvida. Eu sigo, então,
esperando ...espero o dia, espero a noite, espero os anos passarem, espero
esquecer que eu era indomável, grande domadora, que eu era a opressora e agora
sou a submissa. Espero o par de olhos, um de cada cor, que vai me libertar
desse fracasso, desse tédio, dessa dor do teu não. Eu não queria alguém que me
transformasse, que me levasse a loucura? Ta aí, tá ela, tô eu, Thais. Sem plural
porque nosso nome não tem plural. Casaremos com a solidão, nena! Tu porque
permanecerá selvagem, intocável. Eu porque te conheci e depois que te vi, nada
do que vi ou verei, ou tinha vista, foi, é, será mais lindo que teu olhar. A
palavra pra sempre é forte, eu sei. E tudo passa, realmente passa. Só não passa
o que fica pra sempre, o que muda pra sempre, tudo pode mudar, menos as
paixões. Todos serão esquecidos, menos aqueles que nos mostraram o que realmente
tem sentido nessa vida!